RESSACA OU RECARGA?
6h30 da manhã.
Acordo, abro o instagram e a sensação que dá é que sou o único ser humano nesse país que tá consciente a essa hora numa quinta-feira pós carnaval. Já faz um certo tempo, mas é impossível não lembrar da época em que essa manhã era sinônimo de ressaca. Aquele tempo que era mais fácil ver o dia nascer antes de dormir do que acordar para saudar o sol.
Passei o carnaval desconectada do mundo virtual pra conseguir reconectar comigo e com minhas próximas expedições no Atacama. Tenho pra mim que desconectar nem sempre exige solidão e quietude. Minha bateria social tava longe de querer a muvuca carnavalesca, mas não posso negar que tava sentindo falta das trocas, risadas, movimento, vida e fluidez que só os bons encontros trazem. Nos últimos anos, meus carnavais tem sido mais contidos, por assim dizer. Talvez seja a idade chegando, mas dentro de mim ainda vibra uma alegria diferente. A alegria de saber dizer sim apenas para o que faz sentido.
Pela lei natural dos encontros, eu atraí exatamente o que precisava no momento. Alguns viajantes e amigos de estrada decidiram vir me visitar, recheando meu lar com um carnaval de histórias, trilhas, cachoeiras, noites estreladas na fogueira e, claro, muitas delícias e jogatinas na cozinha. Aquela bagunça gostosa e familiar que deixa o coração quentinho. Não demorou nada para que eu me sentisse exatamente como me sinto nas minhas expedições. O lugar é outro, mas o sentimento é muito parecido. São pessoas que compartilham da mesma energia comprometidas em fazer aqueles momentos acontecerem. É assim que a magia acontece.
Sempre que contemplo uma noite estrelada aqui da Mantiqueira, onde eu vivo, acho doido pensar que são as mesmas estrelas que só o breu do deserto é capaz de reluzir. O mistério e a imensidão desse mundo são incríveis demais, né?! Só eu sei quantas estrelas cadentes e quantos pedidos que eu já fiz enquanto conduzia uma roda de conversas com a galera das expedições no Atacama. Meu maior pedido sempre foi que aquilo seguisse se repetindo na minha vida. Quando olho ao redor, sinto que sigo realizando tudo que pedi.
Hoje acordei com chuva por aqui.
Daquelas manhãs preguiçosas com uma inundação de leveza e energia. Troquei a ressaca por uma recarga, de maravilhosas doses de conversa, afeto e banho de cachoeira.
Os dias pra próxima (des)viagem se aproximam e eu sinto desconectar pouco a pouco do mundo de redes sociais pra mergulhar nessa conexão cada vez mais forte com o Atacama. Talvez toda essa nostalgia esteja presente por ser uma das minhas últimas expedições para esse lugar que transformou tanto em mim, não sei dizer. Mas tudo tem parecido uma doce novidade e uma pequena despedida ao mesmo tempo.
Viajar é mais do que chegar a um novo destino, é a mudança que acontece constantemente no conceito do que é a vida.